Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano I Número 8 - Agosto 2oo9
Memória - Roniwalter Jatobá
Convivendo com Mário de Andrade
Secretário particular do poeta e escritor Mário de Andrade por mais de uma década, José Bento Faria Ferraz falou em 1992 sobre sua convivência com o autor de Macunaíma
Durante quase doze anos, José Bento Faria Ferraz foi secretário particular de Mário de Andrade (1893-1945). Toda manhã, de segunda a sexta, no pe¬ríodo de 1934 a 1945, cuidou dos livros à correspondência do morador da rua Lopes Chaves, Barra Funda. Na tarde de 30 de junho de 1992, por mais de 4 horas, eu, Edsel Britto e Milton Andrade conversamos com José Bento, 79 anos, e sua mulher Sônia, 76 anos, na sua casa na ma Ásia, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. José Bento lamentou não ter feito como o secretário de Goethe, que analisou com argúcia, em livro, o convívio com o mestre, e a sua timidez, que de certa forma podou uma maior afinidade entre o auxiliar e o autor de Macunaíma. Mas valeu a pena. Mostra, entre outras coisas, a intimidade do seu dia-a-dia e, mais uma vez, aponta para qualidades já conhecidas de Mário de Andrade, lealdade e humanidade. José Bento faleceu em março de 2005, aos 92 anos de idade.
TUDA – Quando você começou a trabalhar com Mário de Andrade?
José Bento – Vou voltar um pouco antes. Sou filho de mineiros, minha mãe conhecia música, tocava violão muito bem. Meu avô era um boêmio. Eu tinha, portanto, um mundo musical na minha personalidade. E minha mãe desejava muito que eu continuasse meu piano, que aprendia lá em Jacareí, para onde mudamos em 1920. Fui, então, para São Paulo e minha mãe fez questão que eu estudasse no Conservatório Dramático e Musical. Ali, via passar um homem alto, bem vestido, bem posto, rosto levantado. Era Mário de Andrade.
TUDA – Esse conhecimento aconteceu a partir de 1928 até 1933. Havia alguma gota de intimidade?
José Bento – Não. Só via aquele homem, professor, de vez em quando. Ele passava e era só. Quando comecei a freqüentar as aulas de História da Música e Estética com o Mário, aí passei a conhecê-lo mais. E era uma judiação o que Mário fazia. Homem de cultura, cheio de humanismo, ele descia de uma posição tão alta para lecionar para meninos. Meninos que não tinham, talvez, interesse pelas artes musicais. As aulas dele eram maravilhosas. Ele dava aula de piano no Conservatório e em sua casa. E aulas de História da Música, duas vezes por semana. Era uma judiação porque a gente ainda era moço naquele tempo. Pensava mais em brincar com os meninos que estudar História da Arte. Então, comecei a conversar com ele nos intervalos das aulas. Todo mundo saía e eu ficava conversando com o Mário. Conversa rápida, conversa simples, prestava atenção. E comecei a conhecê-lo melhor. Eu era um rapazinho tímido, mocinho ainda. Um dia, comecei, de repente, a fazer ao Mário confidências de ordem econômica. Na época, a minha preocupação maior era não deixar o que estava gostando tanto de fazer, ou seja, a música. Mas também era obrigado a ter um norte na minha vida, a ter uma ocupação. Eu vivia angustiado, vendo meus pais se matando, e eu não achava o norte. Então, conversei com o Mário. Ele ficou quieto, não disse nada. Certo dia, depois da aula, ele falou: "Zé Bento, você não saia que eu quero falar com você". Nós descemos e, na subida do Conservatório, três prédios depois, havia um restaurante, o Palhaço. O Mário me perguntou: "Você já jantou?" Eu disse já. Sentamos na mesa. "Olha, Zé Bento, vou lhe dizer uma coisa: você comentou aquele negócio dois meses atrás... acontece que a minha irmã Lurdes vai casar e agora não tem quem cuide das minhas coisas, dos meus livros, dos meus escritos. Então, estou imaginando: será que você toparia trabalhar comigo?" Lembro bem, as minhas pernas começaram a tremer. "Não tem problema", ele disse depois, "eu te ensino". Mas eu não sou bibliotecário, não entendo nada de livros, eu disse. "É, mas eu te ensino", ele falou. "Você vai procurar o bibliotecário da Municipal e lá ele te arranja uns livrinhos e você vai aprender. Não se preocupe com isso. Você escreve à máquina?" Uns seis meses depois, ele me chamou.
TUDA – Era um bom salário?
José Bento – Ele assim tinha me dito: "Olha, eu não posso pagar muito, porque eu não sou rico. Você vai trabalhar de manhã comigo, três horas por dia". Pagava 200 mil réis. Então, eu trabalhava de manhã. Saía da Vila Mariana bem cedinho e às 7h30 chegava na rua Lopes Chaves. Vinha de bonde, descia a avenida Angélica.
TUDA – Isso foi quando?
José Bento – 1934. Nessa época, comecei a trabalhar também na biblioteca do Sindicato dos Bancários, sucedendo a Edgard Cavalheiro, no prédio Martinelli, à tarde.
TUDA – Como era o seu trabalho na casa da rua Lopes Chaves?
José Bento – Chegava lá às 7h30. O Mário já estava de banho tomado. Ele gostava muito de usar "robe de chambre", tinha um desenhado por ele mesmo. O Mário era muito sensual. Também gostava de coisas finas. Já barbeado... era assim que ele trabalhava, ali sentado na escrivaninha que foi do pai dele. Minha função era cuidar dos livros. Como o clima de São Paulo, não sei se só na Barra Funda, sempre teve muita umidade, certos livros bichavam muito. Tinha o porão da casa dele; desinfetava o porão. Os meus pertences, as minhas latinhas, meu "pó de Pérsia", aquelas receitas de antigamente estavam lá.
TUDA – Foi boa a convivência?
José Bento – Foi sim. Comecei a perceber a riqueza interior daquele homem. Mas, sempre naquela minha posição, coisa muito curiosa, que eu não consegui me libertar, sempre naquela posição meio subalterna. Eu não cheguei a criar com ele uma amizade assim profunda, coisa que a Oneyda Alvarenga e o Luiz Saia conseguiram. O que eu tinha mesmo era respeito pelo Mário. Naquela época se usava outros modos, mesmo os amigos se tratavam com respeito, era senhor, aquela coisa toda. Um dia, o Mário disse: "Pára com esse negócio de senhor, me trata de você".
TUDA – Ele era meticuloso?
José Bento – Muito metódico no seu trabalho, nas suas pesquisas. Isso que você está vendo aí (aponta pastas com índices), herdei dele. Quando cheguei na sua casa achei os fichários feitos. E sempre tinha recados: "Zé Bento, faça isso, Zé Bento, faça aquilo". Muitas vezes ia comprar livros na Livraria Civilização Brasileira. O Mário vivia dependurado em dívidas.
TUDA – Tinha conta na livraria?
José Bento – Sim, comprava e pagava. Ele adorava o livro também como objeto. Ele transparecia sensualidade em ver aquelas coisas todas. Sempre muito calmo. Raramente era visto irado. Às vezes em que o vi irado, a voz dele sumia. Ele implodia...
TUDA – Engolia tudo?
José Bento – Engolia tudo. Por outro lado, várias vezes o surpreendi no banheiro declamando "Ahasverus e o gênio", de Castro Alves, ou então "Juca Pirama", de Gonçalves Dias. Tinha uma TUDA prodigiosa. Mas no resto da manhã, a gente trabalhava em silêncio. Ele cuidava das coisas dele e eu das minhas. Às 9 horas da manhã, eu batendo à máquina...
TUDA – Na Manuela?
José Bento – Sim, na Manuela, homenagem ao Bandeira. Aí batiam à porta, ele abria. Era dona Mariquinha com uma bandeja de café. Era de prata, com três xícaras de café. Então a gente bebia o café que ele mesmo servia.
TUDA – Ele escrevia à mão e você datilografava, não é?
José Bento – O Mário gostava muito de escrever à mão, com aquela letra tranqüila. Cartas datilografadas, só as mais formais. Ele gostava muito de fazer as cartas para a Henriqueta Lisboa, Fernando Silva, Manuel Bandeira.
TUDA – E as cartas de amor?
José Bento – Os amores de Mário... eu tenho a impressão que cessaram quando... eu tenho a impressão que Remate de Males foi o túmulo dos amores do Mário. Aos 40 anos, ele teve uma crise existencial muito forte. Foi um marco na vida dele. Ele tinha uma premonição da morte muito grande. Era de saúde precária. E o Mário se desmandou muito no Rio, de modo que quando ele veio de lá, já iniciava um processo lento de morte. Aliás, num certo sentido, eu compartilho do ponto de vista do Paulo Duarte: o Mário foi conscientemente se matando aos poucos.
TUDA – Solidão? E os amigos que freqüentavam a casa dele?
José Bento – Os amigos são sazonais, não é? Os amigos dos anos 20 não foram os mesmos, nem poderiam ser os mesmos. Raras são as pessoas que têm amigos que as acompanham até a morte, porque a vida vai mudando. Então raras são as pessoas que conservam seus amigos de infância, porque a vida é tão atrapalhada. Então, eu quero crer que os amigos do Mário que permaneceram até o fim foram: Paulo Duarte, o Rubens (Borba de Moraes), o Sérgio, os dois Sérgios (Milliet e Buarque de Hollanda), os amigos do Rio, que duraram muito tempo, o Rodrigo (Mello Franco), o Carlos Drummond de Andrade, o Prudente (de Moraes Neto), o Manuel Bandeira e a Henriqueta Lisboa; as cartas da Henriqueta para o Mário a gente não conhece, mas as do Mário para a Henriqueta é de um amor... A gente percebe que é um amor de amante. É nas cartas para a Henriqueta que ele se abre mais.
TUDA – E a mulher do Ascenso Ferreira?
José Bento – Não estou lembrando. Um amor, pelo menos platônico, de um para outro. Eu não sei... Ele teve vários amores... Eu não sei. Vai caber ao biógrafo de Mário a tarefa pesadíssima de penetrar em todo o inconsciente dele. É difícil, e tem aquela coisa muito triste do Mário, que foi uma das causas, talvez, do rompimento em 1928 com o Oswald. E o Oswald tem uma frase candente, que o "Mário parecia um Oscar Wilde, por detrás". É um assunto chato! Lembro que, uma vez, ele já tinha tido o pré-infarto, mas a rigor foi um infarto mesmo... Foi em 1944, mais ou menos. Estava doente, imóvel, quarenta dias na cama e eu soube de um seminário. E os alunos, pela leitura dos fatos e de suas obras, chegaram à conclusão que o Mário era homossexual. Eu, que nunca tinha ouvido falar nisso, fiquei indignado. Então, escrevi uma carta para a Oneyda (Alvarenga), carta dolorosa, chateado com o que tinha acontecido. Referir a obra de Mário à homossexualidade! Quem sabe pode até se referir, eu não sei, mas eu não podia conhecer aquilo. Então, a Oneyda ousou perguntar ao Mário sobre este aspecto da inimizade, o porquê da inimizade dele com o Oswald. E veio a resposta do Mário: "Olha, Oneyda, por favor, é uma coisa tão suja que eu não quero tocar neste assunto". Tenho a impressão que a coisa do Oswald deve ter machucado muito e que eles nunca mais puderam se entender.
Sônia – Eu até me lembro da época do Guilherme de Almeida no Departamento, que aliás foi uma desilusão. Eu gostava das poesias dele. Colecionava-as. Eu não o conhecia, mas apreciava o que ele escrevia. Zé Bento, lembra daquela senhora que trabalhou com o Guilherme de Almeida? E... na sala dele. Ela foi lá em casa e lançou, quer dizer, puxou conversa, só para dizer que o Mário era homossexual. Tem gente com instinto ruim. Primeiro, não sei se ele era; e se era, era discreto, discretíssimo. Antes do nosso tempo, ele teve uma grande paixão por uma mulher.
José Bento – Maria da Glória?
Sônia – Não, não, imagina! Maria da Glória... nunca... aquela mulher!
TUDA – Quando vocês se casaram?
José Bento – Casamos em 1945.
TUDA – Depois de sua morte, não é? Ele acompanhou a preparação do casamento?
José Bento – O Mário me apoiava muito neste sentido.
TUDA – Vocês tiveram dois filhos, um inclusive chamado Mário, em homenagem a ele. Mário, o de Andrade, gostava de criança?
José Bento – Adorava criança. E a grande preocupação dele era com o menor do meio operário. Eu me lembro bem de que o primeiro parque infantil, ligado ao Sérgio Milliet e à Maria de Lourdes Milliet, já levantava a preocupação de como criar parques para as crianças de operários.
TUDA – Católico?
José Bento – Era, e esse era um problema muito sério para o Mário. Ele tinha uma formação católica, estudou no Colégio Marista. Ele chegou a solicitar -naquele tempo o bom católico tinha de solicitar à autoridade diocesana - uma licença especial para poder ler livros que estivessem no Index, como Voltaire, Diderot, esse pessoal todo do Iluminismo. Pois o Mário fez essa solicitação. Ele participava de procissões de "Corpus Christi"; ele e o Antônio Alcântara Machado. Mas na última fase de Mário de Andrade ele se declarou comunista. Talvez fosse um comunista, mas de ordem intelectual, vamos dizer assim.
TUDA – Nunca entrou em partido?
José Bento – Não. Mesmo a atitude dele em 1932, quando São Paulo inteiro se incorporou, foi meio razoável. Inclusive o irmão dele foi para a frente de batalha. Não sei se era uma premonição.
TUDA – Como é que ele recebia, por exemplo, a crítica, os comentários, sobre seus livros?
José Bento – Eu não gostaria de dizer: era vaidoso. Os sapatos eram feitos sob medida, na sapataria Guarani, em frente à Livraria Civilização Brasileira, ali na rua XV de Novembro. O Mário era muito vaidoso. Usava chapéu. Na hora em que ele saía para almoçar, ele já se trocava. De gravata, tudo direitinho.
TUDA – Comia bem?
José Bento – Ah, era um bom garfo. Gostava de comidas finas.
TUDA – Fumava?
José Bento – Fumava muito. E tinha muita insônia. Quem passasse às 22 horas pela rua Margarida com Lopes Chaves, via aquela janela aberta até 2 ou 3 horas da madrugada. Era o Mário tocando no órgão os corais de Bach. Era para ele poder se libertar das angústias, porque o Mário era um homem angustiado. Eu tenho a impressão que as injustiças do mundo caíam naquela sensibilidade acentuada que ele tinha.
TUDA – A senhora não gosta muito de se lembrar do Mário, não?
Sônia – Não. (Pausa) Eu também tive problemas financeiros, coisas de família. Um dia eu fui procurar o Mário. Nessa ocasião, ele já era diretor do Departamento de Cultura, lá na Cantareira... Era uma pessoa muito à vontade, ou então queria deixar a gente à vontade. Ele disse que estava com fome e mandou buscar bananas. Era uma característica, talvez, da personalidade dele: deixar as pessoas muito à vontade. Eu conversei com ele sobre os meus problemas, disse-lhe que eu precisava de emprego. Ele me convidou para ir ao Departamento de Cultura. Ele também tinha convidado o Zé, que eu não conhecia, mas que já era seu secretário particular. Conheci o Zé Bento lá.
José Bento – E foi uma coisa muito curiosa: eu preparava a documentação para entregar na Divisão do Pessoal da Prefeitura. E, ao buscar isso, vai levar aquilo, eu cruzei várias vezes com uma moça. Então, eu parei e pensei: mas que moça bacana!
Sônia – Eu não estava nem aí...
José Bento – Um dia eu entreguei uns documentos para o Paulo Magalhães, que era o chefe de gabinete do prefeito Fábio Prado, muito amigo do Mário. Em seguida, ele me mandou para a discoteca, que ficava atrás do Teatro Municipal. Quando eu chego na discoteca, correndo, para falar com a Oneyda, a primeira coisa que vejo é aquela moça, lá sentada, escrevendo. E ali está ela... O diabo me passou a perna.
TUDA – Lembra do dia da morte dele?
José Bento – Eu trabalhei no sábado, sábado eu trabalhava à tarde, e fui para a Lopes Chaves. Ele estava de "robe de chambre". Estava pálido. Eu não estava gostando. Eu me lembro que voltei para casa preocupado. No domingo, o Sílvio Alvarenga, marido da Oneyda, encostou o carro na minha casa. Eu falei: "Você por aqui?" Devia ser umas sete e meia da manhã, umas oito horas. Ele falou: "Você não gostaria de ir comigo na casa do Mário?" Eu falei: "Ele não está passando bem, não? Aí eu me aprontei rapidamente e saí. Cheguei lá ele já estava morto.
TUDA – A casa estava cheia?
José Bento – O Luiz Saia passou a noite lá. E me contou: "O Mário pediu uma xícara de chá e começou a tomar. De repente, disse: "Saia, me segure que eu não estou me sentindo bem". Deu a xícara e... aí foi trágico. Porque o quarto do Mário era no andar de cima. A mãe dele ficava no quarto do fundo. Tinha o banheiro e um outro quarto da dona Nhanhá e das outras moças que ainda moravam lá. Mas engraçado, nós, os velhos, vamos adquirindo uma certa calosidade... A mãe soube e não houve este drama que os moços têm... pronto, morreu. Ela se recolheu a um canto e, naturalmente, morreu aos poucos também. Não durou muito, não.
TUDA – E depois da morte dele, você voltou lá na casa?
José Bento – Eu voltei várias vezes para cuidar dos ditames da carta. Porque a carta não era seu testamento, apenas uma intenção. E essa carta estava comigo guardada, eu sabia onde é que estava. Tanto que um dia ele me disse: "Zé, esta carta está aqui. Se acontecer qualquer coisa comigo, você a dê ao Carlos Moraes de Andrade, ao Cade". E eram recomendações para que eu separasse, de acordo com o dr. Carlos Moraes de Andrade, os livros principais para a educação dos sobrinhos: era a Terezinha, o Carlos Augusto e a Maria Luiza. Os restos das coisas, as obras de arte, iriam para a pinacoteca. A parte musical para a discoteca. No post-scriptum da carta, ele até agradece a minha assistência. E deixou para mim uma importância, não sei bem quanto era naquela época, mas este dinheiro nunca se achou. Naturalmente ele precisou dele e usou. Eu ainda fiquei lá mais dois ou três meses, arrumando as coisas e depois eu fui embora. Em 1945 eu comecei a trabalhar lá no Patrimônio. Em 1951, fui para Ribeirão Preto trabalhar na Faculdade de Ribeirão Preto.
TUDA – Da obra do Mário, poesia, conto, romance, você tem alguma preferência? Tem algum livro que marque mais.
José Bento – São as poesias. A última parte da "Meditação sobre o Tietê" é uma coisa extraordinária.
TUDA – Um poema ecológico?
José Bento – É um poema muito bonito, muito mais do que ecológico! Um poema humaníssimo. É o Mário angustiado com a Segunda Guerra Mundial...
TUDA – Essa convivência com o Mário, durante doze anos... O que ela significou, vamos dizer assim, para o resto da sua vida?
José Bento – Significou muito. Me esclareceu, me abriu horizontes, me deu certo sentido de liberdade, um sentido de respeito pela pessoa humana, um sentido de respeito à individualidade de cada um. O Mário me deu esta noção de liberdade... e de amor. E isso eu acho muito importante. Eu só sei dizer a você que foi um período feliz da minha vida, aquele em que eu acreditei nas coisas.
TUDA – Quando você começou a trabalhar com Mário de Andrade?
José Bento – Vou voltar um pouco antes. Sou filho de mineiros, minha mãe conhecia música, tocava violão muito bem. Meu avô era um boêmio. Eu tinha, portanto, um mundo musical na minha personalidade. E minha mãe desejava muito que eu continuasse meu piano, que aprendia lá em Jacareí, para onde mudamos em 1920. Fui, então, para São Paulo e minha mãe fez questão que eu estudasse no Conservatório Dramático e Musical. Ali, via passar um homem alto, bem vestido, bem posto, rosto levantado. Era Mário de Andrade.
TUDA – Esse conhecimento aconteceu a partir de 1928 até 1933. Havia alguma gota de intimidade?
José Bento – Não. Só via aquele homem, professor, de vez em quando. Ele passava e era só. Quando comecei a freqüentar as aulas de História da Música e Estética com o Mário, aí passei a conhecê-lo mais. E era uma judiação o que Mário fazia. Homem de cultura, cheio de humanismo, ele descia de uma posição tão alta para lecionar para meninos. Meninos que não tinham, talvez, interesse pelas artes musicais. As aulas dele eram maravilhosas. Ele dava aula de piano no Conservatório e em sua casa. E aulas de História da Música, duas vezes por semana. Era uma judiação porque a gente ainda era moço naquele tempo. Pensava mais em brincar com os meninos que estudar História da Arte. Então, comecei a conversar com ele nos intervalos das aulas. Todo mundo saía e eu ficava conversando com o Mário. Conversa rápida, conversa simples, prestava atenção. E comecei a conhecê-lo melhor. Eu era um rapazinho tímido, mocinho ainda. Um dia, comecei, de repente, a fazer ao Mário confidências de ordem econômica. Na época, a minha preocupação maior era não deixar o que estava gostando tanto de fazer, ou seja, a música. Mas também era obrigado a ter um norte na minha vida, a ter uma ocupação. Eu vivia angustiado, vendo meus pais se matando, e eu não achava o norte. Então, conversei com o Mário. Ele ficou quieto, não disse nada. Certo dia, depois da aula, ele falou: "Zé Bento, você não saia que eu quero falar com você". Nós descemos e, na subida do Conservatório, três prédios depois, havia um restaurante, o Palhaço. O Mário me perguntou: "Você já jantou?" Eu disse já. Sentamos na mesa. "Olha, Zé Bento, vou lhe dizer uma coisa: você comentou aquele negócio dois meses atrás... acontece que a minha irmã Lurdes vai casar e agora não tem quem cuide das minhas coisas, dos meus livros, dos meus escritos. Então, estou imaginando: será que você toparia trabalhar comigo?" Lembro bem, as minhas pernas começaram a tremer. "Não tem problema", ele disse depois, "eu te ensino". Mas eu não sou bibliotecário, não entendo nada de livros, eu disse. "É, mas eu te ensino", ele falou. "Você vai procurar o bibliotecário da Municipal e lá ele te arranja uns livrinhos e você vai aprender. Não se preocupe com isso. Você escreve à máquina?" Uns seis meses depois, ele me chamou.
TUDA – Era um bom salário?
José Bento – Ele assim tinha me dito: "Olha, eu não posso pagar muito, porque eu não sou rico. Você vai trabalhar de manhã comigo, três horas por dia". Pagava 200 mil réis. Então, eu trabalhava de manhã. Saía da Vila Mariana bem cedinho e às 7h30 chegava na rua Lopes Chaves. Vinha de bonde, descia a avenida Angélica.
TUDA – Isso foi quando?
José Bento – 1934. Nessa época, comecei a trabalhar também na biblioteca do Sindicato dos Bancários, sucedendo a Edgard Cavalheiro, no prédio Martinelli, à tarde.
TUDA – Como era o seu trabalho na casa da rua Lopes Chaves?
José Bento – Chegava lá às 7h30. O Mário já estava de banho tomado. Ele gostava muito de usar "robe de chambre", tinha um desenhado por ele mesmo. O Mário era muito sensual. Também gostava de coisas finas. Já barbeado... era assim que ele trabalhava, ali sentado na escrivaninha que foi do pai dele. Minha função era cuidar dos livros. Como o clima de São Paulo, não sei se só na Barra Funda, sempre teve muita umidade, certos livros bichavam muito. Tinha o porão da casa dele; desinfetava o porão. Os meus pertences, as minhas latinhas, meu "pó de Pérsia", aquelas receitas de antigamente estavam lá.
TUDA – Foi boa a convivência?
José Bento – Foi sim. Comecei a perceber a riqueza interior daquele homem. Mas, sempre naquela minha posição, coisa muito curiosa, que eu não consegui me libertar, sempre naquela posição meio subalterna. Eu não cheguei a criar com ele uma amizade assim profunda, coisa que a Oneyda Alvarenga e o Luiz Saia conseguiram. O que eu tinha mesmo era respeito pelo Mário. Naquela época se usava outros modos, mesmo os amigos se tratavam com respeito, era senhor, aquela coisa toda. Um dia, o Mário disse: "Pára com esse negócio de senhor, me trata de você".
TUDA – Ele era meticuloso?
José Bento – Muito metódico no seu trabalho, nas suas pesquisas. Isso que você está vendo aí (aponta pastas com índices), herdei dele. Quando cheguei na sua casa achei os fichários feitos. E sempre tinha recados: "Zé Bento, faça isso, Zé Bento, faça aquilo". Muitas vezes ia comprar livros na Livraria Civilização Brasileira. O Mário vivia dependurado em dívidas.
TUDA – Tinha conta na livraria?
José Bento – Sim, comprava e pagava. Ele adorava o livro também como objeto. Ele transparecia sensualidade em ver aquelas coisas todas. Sempre muito calmo. Raramente era visto irado. Às vezes em que o vi irado, a voz dele sumia. Ele implodia...
TUDA – Engolia tudo?
José Bento – Engolia tudo. Por outro lado, várias vezes o surpreendi no banheiro declamando "Ahasverus e o gênio", de Castro Alves, ou então "Juca Pirama", de Gonçalves Dias. Tinha uma TUDA prodigiosa. Mas no resto da manhã, a gente trabalhava em silêncio. Ele cuidava das coisas dele e eu das minhas. Às 9 horas da manhã, eu batendo à máquina...
TUDA – Na Manuela?
José Bento – Sim, na Manuela, homenagem ao Bandeira. Aí batiam à porta, ele abria. Era dona Mariquinha com uma bandeja de café. Era de prata, com três xícaras de café. Então a gente bebia o café que ele mesmo servia.
TUDA – Ele escrevia à mão e você datilografava, não é?
José Bento – O Mário gostava muito de escrever à mão, com aquela letra tranqüila. Cartas datilografadas, só as mais formais. Ele gostava muito de fazer as cartas para a Henriqueta Lisboa, Fernando Silva, Manuel Bandeira.
TUDA – E as cartas de amor?
José Bento – Os amores de Mário... eu tenho a impressão que cessaram quando... eu tenho a impressão que Remate de Males foi o túmulo dos amores do Mário. Aos 40 anos, ele teve uma crise existencial muito forte. Foi um marco na vida dele. Ele tinha uma premonição da morte muito grande. Era de saúde precária. E o Mário se desmandou muito no Rio, de modo que quando ele veio de lá, já iniciava um processo lento de morte. Aliás, num certo sentido, eu compartilho do ponto de vista do Paulo Duarte: o Mário foi conscientemente se matando aos poucos.
TUDA – Solidão? E os amigos que freqüentavam a casa dele?
José Bento – Os amigos são sazonais, não é? Os amigos dos anos 20 não foram os mesmos, nem poderiam ser os mesmos. Raras são as pessoas que têm amigos que as acompanham até a morte, porque a vida vai mudando. Então raras são as pessoas que conservam seus amigos de infância, porque a vida é tão atrapalhada. Então, eu quero crer que os amigos do Mário que permaneceram até o fim foram: Paulo Duarte, o Rubens (Borba de Moraes), o Sérgio, os dois Sérgios (Milliet e Buarque de Hollanda), os amigos do Rio, que duraram muito tempo, o Rodrigo (Mello Franco), o Carlos Drummond de Andrade, o Prudente (de Moraes Neto), o Manuel Bandeira e a Henriqueta Lisboa; as cartas da Henriqueta para o Mário a gente não conhece, mas as do Mário para a Henriqueta é de um amor... A gente percebe que é um amor de amante. É nas cartas para a Henriqueta que ele se abre mais.
TUDA – E a mulher do Ascenso Ferreira?
José Bento – Não estou lembrando. Um amor, pelo menos platônico, de um para outro. Eu não sei... Ele teve vários amores... Eu não sei. Vai caber ao biógrafo de Mário a tarefa pesadíssima de penetrar em todo o inconsciente dele. É difícil, e tem aquela coisa muito triste do Mário, que foi uma das causas, talvez, do rompimento em 1928 com o Oswald. E o Oswald tem uma frase candente, que o "Mário parecia um Oscar Wilde, por detrás". É um assunto chato! Lembro que, uma vez, ele já tinha tido o pré-infarto, mas a rigor foi um infarto mesmo... Foi em 1944, mais ou menos. Estava doente, imóvel, quarenta dias na cama e eu soube de um seminário. E os alunos, pela leitura dos fatos e de suas obras, chegaram à conclusão que o Mário era homossexual. Eu, que nunca tinha ouvido falar nisso, fiquei indignado. Então, escrevi uma carta para a Oneyda (Alvarenga), carta dolorosa, chateado com o que tinha acontecido. Referir a obra de Mário à homossexualidade! Quem sabe pode até se referir, eu não sei, mas eu não podia conhecer aquilo. Então, a Oneyda ousou perguntar ao Mário sobre este aspecto da inimizade, o porquê da inimizade dele com o Oswald. E veio a resposta do Mário: "Olha, Oneyda, por favor, é uma coisa tão suja que eu não quero tocar neste assunto". Tenho a impressão que a coisa do Oswald deve ter machucado muito e que eles nunca mais puderam se entender.
Sônia – Eu até me lembro da época do Guilherme de Almeida no Departamento, que aliás foi uma desilusão. Eu gostava das poesias dele. Colecionava-as. Eu não o conhecia, mas apreciava o que ele escrevia. Zé Bento, lembra daquela senhora que trabalhou com o Guilherme de Almeida? E... na sala dele. Ela foi lá em casa e lançou, quer dizer, puxou conversa, só para dizer que o Mário era homossexual. Tem gente com instinto ruim. Primeiro, não sei se ele era; e se era, era discreto, discretíssimo. Antes do nosso tempo, ele teve uma grande paixão por uma mulher.
José Bento – Maria da Glória?
Sônia – Não, não, imagina! Maria da Glória... nunca... aquela mulher!
TUDA – Quando vocês se casaram?
José Bento – Casamos em 1945.
TUDA – Depois de sua morte, não é? Ele acompanhou a preparação do casamento?
José Bento – O Mário me apoiava muito neste sentido.
TUDA – Vocês tiveram dois filhos, um inclusive chamado Mário, em homenagem a ele. Mário, o de Andrade, gostava de criança?
José Bento – Adorava criança. E a grande preocupação dele era com o menor do meio operário. Eu me lembro bem de que o primeiro parque infantil, ligado ao Sérgio Milliet e à Maria de Lourdes Milliet, já levantava a preocupação de como criar parques para as crianças de operários.
TUDA – Católico?
José Bento – Era, e esse era um problema muito sério para o Mário. Ele tinha uma formação católica, estudou no Colégio Marista. Ele chegou a solicitar -naquele tempo o bom católico tinha de solicitar à autoridade diocesana - uma licença especial para poder ler livros que estivessem no Index, como Voltaire, Diderot, esse pessoal todo do Iluminismo. Pois o Mário fez essa solicitação. Ele participava de procissões de "Corpus Christi"; ele e o Antônio Alcântara Machado. Mas na última fase de Mário de Andrade ele se declarou comunista. Talvez fosse um comunista, mas de ordem intelectual, vamos dizer assim.
TUDA – Nunca entrou em partido?
José Bento – Não. Mesmo a atitude dele em 1932, quando São Paulo inteiro se incorporou, foi meio razoável. Inclusive o irmão dele foi para a frente de batalha. Não sei se era uma premonição.
TUDA – Como é que ele recebia, por exemplo, a crítica, os comentários, sobre seus livros?
José Bento – Eu não gostaria de dizer: era vaidoso. Os sapatos eram feitos sob medida, na sapataria Guarani, em frente à Livraria Civilização Brasileira, ali na rua XV de Novembro. O Mário era muito vaidoso. Usava chapéu. Na hora em que ele saía para almoçar, ele já se trocava. De gravata, tudo direitinho.
TUDA – Comia bem?
José Bento – Ah, era um bom garfo. Gostava de comidas finas.
TUDA – Fumava?
José Bento – Fumava muito. E tinha muita insônia. Quem passasse às 22 horas pela rua Margarida com Lopes Chaves, via aquela janela aberta até 2 ou 3 horas da madrugada. Era o Mário tocando no órgão os corais de Bach. Era para ele poder se libertar das angústias, porque o Mário era um homem angustiado. Eu tenho a impressão que as injustiças do mundo caíam naquela sensibilidade acentuada que ele tinha.
TUDA – A senhora não gosta muito de se lembrar do Mário, não?
Sônia – Não. (Pausa) Eu também tive problemas financeiros, coisas de família. Um dia eu fui procurar o Mário. Nessa ocasião, ele já era diretor do Departamento de Cultura, lá na Cantareira... Era uma pessoa muito à vontade, ou então queria deixar a gente à vontade. Ele disse que estava com fome e mandou buscar bananas. Era uma característica, talvez, da personalidade dele: deixar as pessoas muito à vontade. Eu conversei com ele sobre os meus problemas, disse-lhe que eu precisava de emprego. Ele me convidou para ir ao Departamento de Cultura. Ele também tinha convidado o Zé, que eu não conhecia, mas que já era seu secretário particular. Conheci o Zé Bento lá.
José Bento – E foi uma coisa muito curiosa: eu preparava a documentação para entregar na Divisão do Pessoal da Prefeitura. E, ao buscar isso, vai levar aquilo, eu cruzei várias vezes com uma moça. Então, eu parei e pensei: mas que moça bacana!
Sônia – Eu não estava nem aí...
José Bento – Um dia eu entreguei uns documentos para o Paulo Magalhães, que era o chefe de gabinete do prefeito Fábio Prado, muito amigo do Mário. Em seguida, ele me mandou para a discoteca, que ficava atrás do Teatro Municipal. Quando eu chego na discoteca, correndo, para falar com a Oneyda, a primeira coisa que vejo é aquela moça, lá sentada, escrevendo. E ali está ela... O diabo me passou a perna.
TUDA – Lembra do dia da morte dele?
José Bento – Eu trabalhei no sábado, sábado eu trabalhava à tarde, e fui para a Lopes Chaves. Ele estava de "robe de chambre". Estava pálido. Eu não estava gostando. Eu me lembro que voltei para casa preocupado. No domingo, o Sílvio Alvarenga, marido da Oneyda, encostou o carro na minha casa. Eu falei: "Você por aqui?" Devia ser umas sete e meia da manhã, umas oito horas. Ele falou: "Você não gostaria de ir comigo na casa do Mário?" Eu falei: "Ele não está passando bem, não? Aí eu me aprontei rapidamente e saí. Cheguei lá ele já estava morto.
TUDA – A casa estava cheia?
José Bento – O Luiz Saia passou a noite lá. E me contou: "O Mário pediu uma xícara de chá e começou a tomar. De repente, disse: "Saia, me segure que eu não estou me sentindo bem". Deu a xícara e... aí foi trágico. Porque o quarto do Mário era no andar de cima. A mãe dele ficava no quarto do fundo. Tinha o banheiro e um outro quarto da dona Nhanhá e das outras moças que ainda moravam lá. Mas engraçado, nós, os velhos, vamos adquirindo uma certa calosidade... A mãe soube e não houve este drama que os moços têm... pronto, morreu. Ela se recolheu a um canto e, naturalmente, morreu aos poucos também. Não durou muito, não.
TUDA – E depois da morte dele, você voltou lá na casa?
José Bento – Eu voltei várias vezes para cuidar dos ditames da carta. Porque a carta não era seu testamento, apenas uma intenção. E essa carta estava comigo guardada, eu sabia onde é que estava. Tanto que um dia ele me disse: "Zé, esta carta está aqui. Se acontecer qualquer coisa comigo, você a dê ao Carlos Moraes de Andrade, ao Cade". E eram recomendações para que eu separasse, de acordo com o dr. Carlos Moraes de Andrade, os livros principais para a educação dos sobrinhos: era a Terezinha, o Carlos Augusto e a Maria Luiza. Os restos das coisas, as obras de arte, iriam para a pinacoteca. A parte musical para a discoteca. No post-scriptum da carta, ele até agradece a minha assistência. E deixou para mim uma importância, não sei bem quanto era naquela época, mas este dinheiro nunca se achou. Naturalmente ele precisou dele e usou. Eu ainda fiquei lá mais dois ou três meses, arrumando as coisas e depois eu fui embora. Em 1945 eu comecei a trabalhar lá no Patrimônio. Em 1951, fui para Ribeirão Preto trabalhar na Faculdade de Ribeirão Preto.
TUDA – Da obra do Mário, poesia, conto, romance, você tem alguma preferência? Tem algum livro que marque mais.
José Bento – São as poesias. A última parte da "Meditação sobre o Tietê" é uma coisa extraordinária.
TUDA – Um poema ecológico?
José Bento – É um poema muito bonito, muito mais do que ecológico! Um poema humaníssimo. É o Mário angustiado com a Segunda Guerra Mundial...
TUDA – Essa convivência com o Mário, durante doze anos... O que ela significou, vamos dizer assim, para o resto da sua vida?
José Bento – Significou muito. Me esclareceu, me abriu horizontes, me deu certo sentido de liberdade, um sentido de respeito pela pessoa humana, um sentido de respeito à individualidade de cada um. O Mário me deu esta noção de liberdade... e de amor. E isso eu acho muito importante. Eu só sei dizer a você que foi um período feliz da minha vida, aquele em que eu acreditei nas coisas.